terça-feira, 14 de agosto de 2012

Desapego

"Eu recebo o teu amor por mim..."


Eu não sou das pessoas que melhor reage a mudanças, embora entenda que elas sejam normais e necessárias. Mudanças implicam, na sua grande maioria, em renúncia e no reconhecimento de que o que somos e a nossa existência são ínfimas demais diante de coisas que as nossas mãos não podem apalpar, nossos braços não podem agarrar e os olhos ver.

Confesso que sou egoísta quanto a aquilo que eu acredito me trazer plena felicidade. Porque quem, em sã consciência, tem prazer em abrir mão de algo quando na verdade o desejo do coração é contrário ao que é exigido? Entende o que eu quero dizer? Compreendo que o que é dado pode ser tirado a qualquer momento. Entendo também que eu não possuo nada que seja verdadeiramente meu, apenas tomo conta com bastante zelo pelo tempo que for necessário estar em minha posse.

Eu entendo também que dentro de mim existem duas pessoas distintas que almejam o mesmo objetivo. Ou seja, eu tenho consciência de que existe o desejo do meu coração e o desejo do coração Daquele que me fez, a saber, Deus. Tenho ciência de que o desejo do meu coração quase sempre não é o mesmo daquele que reside no coração Dele, embora Ele permita que muita coisa dentro da minha vontade seja feita para que eu aprenda e compreenda como o sistema funciona.

Para ficar um pouco mais claro como essa coisa de vontade de Deus e vontade permissiva de Deus, darei um exemplo que está no nosso cotidiano: Imagine um pai e seu filho. O filho teimoso, pede algo e o pai lhe diz “não”. Mas, como a criança é danada e o pai para cessar a discussão de uma forma que o filho entenda o que lhe é melhor, o desejo é concedido embora essa não seja a vontade.

O tempo passa e o filho retorna à presença do pai confessando que era melhor não ter recebido o que tanto havia pedido e esperrinhado para ter. Gentilmente, e sem precisar abrir a boca com a expressão “Eu não te disse?”, o pai adverte e ensina o filho de maneira prática e factual que às vezes não ter é a melhor opção. Que às vezes ficar de mãos vazias significa estar empanturrado de presentes sem poder segurá-los devido o seu grande número.

Apesar de não serem muitas as pessoas que compartilhem do mesmo pensamento, é assim que as coisas funcionam entre Deus e o ser humano. É assim que funciona a vontade de Deus e a vontade permissiva de Deus. O versículo 2 no capítulo 12 da carta aos Romanos expressa muito bem essa verdade:
Não se amoldem ao padrão deste mundo, mas transformem-se pela renovação da sua mente, para que sejam capazes de experimentar e comprovar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.
E que fique claro, pois a vontade de Deus é que vivamos em abundância (João 10:10b) enquanto que a vontade permissiva Dele consiste em nos ensinar e admoestar, usando a nossa teimosia como objeto real de arrependimento e reconhecimento. Não se “amoldar” e não se “conformar” podem ter várias compreensões, porém nesse nosso caso em questão, resulta em não se deixar levar pelo egoísmo que se abriga em nosso peito. Geralmente, quando nos encontramos aflitos por algo, tendemos a fazer nossas preces e “pensamentos positivos” de forma que a nossa súplica aconteça como num passe de mágica, como alguém que faz um pedido para um gênio da lâmpada mágica na esperança do mesmo conceder na íntegra a nossa prosopopeia intimista e mesquinha.

Eu não sou daquele tipo de pessoa que consegue descansar plenamente quando o desejo do meu coração foge das minhas mãos. Mas, aí vem o justo juízo de valor quando concluo que nada fica retido em minhas mãos, nem mesmo a minha vida e os meus dias, o pleno funcionamento do meu corpo por mais abundantes que sejam as atividades físicas. O que quero dizer com isso tudo é que a vontade de Deus é boa e agradável sempre e sempre. Para complementar esse pensamento, eu faço uso da passagem que está no Salmo 37, versículos 4 e 5:
Deleite-se no Senhor, e ele atenderá aos desejos do seu coração. Entregue o seu caminho ao Senhor; confie nele, e ele agirá.
Como qualquer outro ser humano, eu tenho as minhas necessidades, ansiedades, sonhos. Contudo, compreendo também que elas de nada valem e têm serventia se não passarem pelo crivo do que é vontade de Deus ou não. Porque fiquem certos, é melhor ouvir o “não” divino do que o “sim” acompanhado de um coração triste como quem já sabe que no fim da estrada existe um desfiladeiro, um ladrão, uma tendência à vaidade, etc. É melhor ficar de mãos vazias, com o coração apertado do que ter rios de ouro nos punhos acompanhado de insegurança e medo em perder tudo.

Por fim, eu entendo que as mudanças, apesar de desagradáveis, mas necessárias, são o meio menos dolorido de crescer sem marcas tão profundas e com dores suportáveis. Compreendo também que o meu eu humano de ser não se isenta da tristeza, mas se regozija com/na a admoestação e aprendizado.

Nenhum comentário: