sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Auto-ironia

There comes a time in life where everything seems narrow. Choices have been made. I can only continue on. I’ve done everything to reach this point and now that I’m here, I’m fucking bored. The hardest thing is knowing whether I’m still alive.” (Dê-se o prazer de traduzir para entender o todo)

 

[...]

Vivemos uma eterna dicotomia de querer um “eterno enquanto dure” ou “que dure para todo o sempre”. Assisti dia desses o filme Mr. Nobody, um longa ao estilo Drama Ficção Científica do diretor belga Jaco Van Dormael. No papel principal está o ator e músico Jared Leto interpretando o Nimo Nobody que também assume papel de narrador, abordando temáticas intrinsecamente existenciais e psicanalíticas voltadas para o comportamento e valores humanos. O filme é na verdade uma lombra, uma viagem na maionese muito grande que se resume a uma única constatação, feita pelo próprio Nobody: “será que estamos realmente vivos ou isso aqui não apenas mais uma mera invenção da mente criativa de uma criança de nove anos?".

Detalhe, se você quer ver o filme, nem continue lendo o texto, porque tem bastantes detalhes aqui. Não poupei esforço pra tentar fazer uma coisa redondinha e concisa, por mais difícil que isso seja principalmente em se tratando de uma crônica baseada em um filme totalmente livre de conceito final. O filme é pra lá de subjetivo, dá a liberdade para qualquer um extrair algo ou apenas continuar a se perguntar do que realmente se trata. Mas, se você quiser continuando a ler, enjoy.

O filme começa com o personagem principal e narrador (Nimo Nobody) acordando no ano de 2092, bastante idoso (com 120 anos). Ele na verdade é o ultimo ser humano mortal na face da Terra. Nesse contexto só existem seres eternos, portanto geneticamente modificados. Por sua vez, ele acaba se transformando numa espécie de espetáculo mundial até no momento da sua morte. Um jovem jornalista resolve entrevistá-lo para fazer uma reportagem com os depoimentos possivelmente colhidos. É aí que a estória começa a tomar um rumo intrigante, onde a realidade passa a ser ilusão e vice-versa. O pobre do jornalista fica sem saber o que é fato e o que é conto, diferenciar real do ilusório.

O filme inteiro simplesmente não passa de um sonho, uma força de vontade, um escape emocional de uma criança de nove anos, ou seja, o próprio Nimo Nobody, que se vê na triste situação de optar viver ou com a mãe ou com o pai. Os pais de Nimo se divorciam e o drama está na decisão que ele precisa ter: ficar com o pai ou com a mãe. Como forma de escape do mundo real o jovem Nobody no alto da sua meninice começa a fantasiar, brincar com a mente sortida que só uma criança em desenvolvimento de caráter e imaginação pode ter. Quem assiste ao filme facilmente se esquece que aquilo é parte da imaginação de uma criança e não algo sendo contado.

Conversava com minha grande amiga @De_Almanaque sobre o filme. Eu o indiquei para ela, pois sabia que de uma forma ou outra ela iria se agradar do tema. Intrigante que apesar da confusão entre realidade e ficção dentro do filme, ambos concordamos que Nimo desde cedo muito ironicamente já sabia o que queria, como queria e quem queria. Ele apenas não queria ter essa responsabilidade naquele momento. Daí a fantasia, o sonho, o escape. Já eu e @De_Almanaque ainda tentamos perseguir alguma coisa nos causando assim ansiedade vez outra, além de longas e redundantes conversas das quais conhecemos o fim.

No filme, também fazem parte três garotinhas: Elise, Anna e Jean. No entanto, o pequeno Nobody já tem plena consciência de que é a personagem Anna (enquanto criança interpretada por Laura Brumagne, adolescente por Juno Temple e adulta por Diane Kruger) que é dele e para ele. Nessa parte do filme, é fácil mais uma vez ficar sem saber se o enredo faz algum sentido. Vez outra é intercalada com narrações sobre ficção e psicanálise feitas pelo Jared Leto, todas voltadas para o lado existencial e comportamental do ser humano como já fora comentado anteriormente. Flashbacks também surgem como se vários apêndices estivessem criando uma teia única, várias informações ao mesmo tempo sobre o mesmo tema só que com visões diferenciadas.

Como eu tinha dito antes, o filme é uma viagem na maionese, mas são essas viagens que fazem a gente pensar em algo mais, a se interiorizar e simplesmente sonhar. Não se sonha mais nos dias de hoje, as projeções feitas são todas voltadas para algum tipo de sucesso e poder no ter. Não se acorda mais com a simples vontade em se esvaziar e dedicar-se a algo que possa nem ter retorno, apenas pelo simples fato de existir dedicação. Singelezas a parte, os valores atuais estão mortos, vivemos em uma sociedade morta, apenas isso!

Nimo, ao longo de sua viagem introspectiva se vê crendo piamente de que é com Anna que ele vai ter uma vida inteira. Em Anna é projetado um passado-presente-futuro de tudo que ele gostaria de continuar tendo antes de seus pais se divorciarem, isso sem contar com o amor ainda não desabrochado, guardado em secreto no âmago de um ser que ainda tenta saber primeiro porque está vivo e porque veio ao mundo.

Penso que o complicado ao ver esse filme é tentar manter a serenidade, foco, equilíbrio enquanto que na realidade os personagens não têm sequer a intenção de transmitirem alguma coisa, não sentem e nem sabem como sentir porque simplesmente eles não existem, são fruto da imaginação de uma criança que apenas quer ter os pais por perto mais uma vez. É na imaginação que o personagem dá-se o trabalho de escolher o que quer, porque lá ele tem liberdade e autonomia para isso. E quem nos garante de que na nossa vidinha real isso também não seja possível?

Anna na verdade existe apenas enquanto criança. Adolescente e mais tarde adulta é mera fomentação de idéias. O mesmo se dá para o Nimo adolescente, depois adulto e por fim idoso como ultimo mortal da face da Terra contando essa estória para o jornalista.

Quantas vezes eu me questionei por não ter tido esse tipo de afeto dentro da casa dos 10 anos. O que mais pude absorver da minha adolescência foi o conflituoso relacionamento dos meus pais, as quatro separações ininterruptas, traição como forma de escape para a felicidade da minha mãe e por fim minha irmã começando um namoro (quando ela tinha 13 anos de idade) que se estendeu por oito longos anos. Hoje entendo que o namoro dela mais parecia uma forma de ter felicidade conjugal, coisa que nós não tivemos por parte de nossos pais, no caso o principal exemplo que poderíamos querer ter em nossas vidas até que o mundo nos descobrisse e vice-versa.

Mr. Nobody” me fez sentir à vontade, é como se um filme baseado em ficção pudesse retratar parte do que eu fantasiei também na minha meninice e adolescência. Opções de escolha dentro de um mundo fictício, que pode se transformar em real ou se manter na ilusão resignada. Sem essa de tristeza, hoje eu me divirto a custa disso tudo. A vida é feita de ironia não é mesmo? Real ou não a vida é feita de ironias, coisas que aprendemos a rir para evitar uma estagnação, seguir em frente e manter por perto pessoas, valores, situações que podem fomentar algum tipo de “evolução”.

Sobre minha família, ela não chegou a ser multifacetária como a do Nimo Nobody, mas ao menos meus pais finalmente tomaram jeito (esse ano comemoraram 25 anos de matrimônio), mas também foi preciso uma conversa pesada entre nós quatro (meu pai, minha mãe, irmã e eu) e isso também não quer dizer que estamos todos muito felizes e radiantes como num comercial de margarina. Apenas aprendemos a conviver, isso basta! Minha irmã terminou o namoro e consegue descobrir agora a adolescência perdida, conflitando consigo mesma, pois eu reconheço que interiormente falando ela é uns 10 anos mais velha pelos decorrentes episódios que a vida proporciona.

Quanto a mim, bem, to aí né, escrevendo essas coisas sem sentindo, introspectividades aleatórias para quem quiser ler. Mas, antes de tudo para mim mesmo, uma forma de fazer lembrar sempre do que pode ser real ou não, do que vale à pena brincar de fantasiar ou não. Somos eternas crianças insistindo em crescer, isso sim!

3 comentários:

Nanda Assis disse...

adoro sua inteligencia e visão.

bjosss...

Samanta disse...

O dilema de Nemo é o dilema da escolha; no fim, somos todos crianças de nove anos analisando qual o melhor doce.

Anônimo disse...

Cara, adorei o texto, adorei a interpretação do texto e também adorei o filme, que vi essa semana.

Sério mesmo, gostei muito. Parabéns por essa sua capacidade de botar os sentimentos em palavras.

Abraços